sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Guincharam meu tempo (Guilherme Siebert)

- Cara, fica aí mais um pouco - disse o Renato, me enrolando.


- Não dá, tenho muito trabalho pra terminar e já está tarde - expliquei.

E ficava cada vez mais difícil sair daquele lugar. Por um lado, eu já havia trabalhado o dia inteiro, e aquele tempo livre não me fazia mal algum. Por outro lado, se eu ainda quisesse dormir, precisava concluir o trabalho logo. Afinal já eram 1h20 da matina.

- Tá bom, vou ficar mais uma meia hora - cedi.

Fui enrolado por mais 40 minutos, até o sentimento de irresponsabilidade arrombar a porta da minha consciência. Incrível é a habilidade dos amigos em demorar para se despedirem. Ainda mais quando se tem pressa. O Gabriel vai ao banheiro, e o Paulo pede pra esperar porque não sabe onde estava a chave da porta que o Gabriel guardou. Como se não fosse suficiente, brincam de segurar a porta do elevador.

Finalmente no térreo, passo pela saída do prédio e caminho em direção à vaga em que deixei meu carro. Sigo preocupado com o tempo que perdi e calculo a possibilidade de terminar o trabalho em tempo. Quando dou por mim, vejo a vaga, mas não vejo meu carro. Eu estava no lugar certo, mas meu carro não estava lá. Volto, às pressas, para o prédio.

- Roubaram meu carro! - falei ao porteiro.

- Ahn? - sábias palavras do sábio homem.

O trajeto do elevador até o 6º andar nunca havia sido tão longo. O carro não tinha seguro e nem sequer era meu. Meu pai, o mais acostumado com minhas encrencas, estava fora do país - era o fim! Eu nunca conseguiria pagar aquele carro, eu não tinha mais que mil reais em conta. Pelo menos era o suficiente para fugir da cidade.

Cheguei ao apartamento do Gabriel, abri a porta e:

- Roubaram meu carro!

- Ahn? - sábias palavras dos sábios amigos.

Todos correram para o elevador. Lamentei durante todo o trajeto. Eu ainda tinha aquele trabalho para concluir.

- Cara, pelo menos é um carro barato, não é tanto prejuízo - me "confortou" o amigo, cuja identidade prefiro não revelar.

A porta do elevador se abriu, todos expressavam sentimentos e conselhos distintos, exceto o porteiro, este ainda estava em silêncio. Caminhávamos lado a lado, em câmera lenta e em silêncio - ao menos é o que me lembro. Não havia o que me distraísse naquele momento, meus ouvidos filtravam todo som ou ruído daquele instante. Nos aproximávamos da cena do crime, e lá estava a prova.



No chão, um adesivo com a frase: VEÍCULO GUINCHADO

Meus amigos, aprendam esta grande lição: se você valoriza seu tempo, invista um minuto estacionando direito.

Um comentário:

  1. Guilherme nos faz viajar por sentimentos pavorosos em seu texto - aliás, sentimentos que experimentei duas vezes, já! Surpreende-nos com a solução fazendo com que não consigamos deixar de pensar nas infinitas vezes em que temos muito mais sorte do que juízo e que, por isso, nos instiga a buscar um pouco mais deste último.

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