sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Eu e ela (Larissa Janz)

Todo dia ela acorda e lava o rosto, aquele rosto bonito que não se cansa de olhar para mim. Quer dizer, nem sempre ela acorda e lava o rosto; alguns dias, ela se levanta e dança como se estivesse em uma festa.


Ela se veste olhando para mim e, depois, me pergunta: “Ficou bom assim?” Eu digo que sim, obviamente. Mas ela não me escuta, não presta atenção quando eu digo o quão linda ela é e que basta ela olhar para mim que entenderá o que eu digo. Assim, ela se troca várias e várias vezes até achar algo em que se sinta bem ou até que se canse.

Antes de sair, ela sempre vem me dar um tchau. Sempre se analisa à minha frente para conferir se não há nada de errado com ela.

Sozinho, eu não sou nada. Sem ela, não há razão para minha existência. Ela sempre vai ser aquela que eu vi crescer, que eu acompanhei em sua rotina e que eu pude ajudar a ganhar confiança em si mesma.

Já perdi as contas de quantas vezes ela já praticou suas apresentações diante de mim, de quantos ensaios de teatro (ou de beijos) ela já fez. Amo quando se solta para mim, pois assim posso mostrar a ela exatamente como eu a vejo.

Ela passa horas olhando para mim, imaginando quem ela vai ser e como a sua vida será dali para a frente. Já a vi chorar inúmeras vezes. Muitas vezes, ela não tinha com quem falar, então falou comigo, pois sabia que eu nunca a deixaria.

Várias vezes ela me machucou, me sujou, me jogou e eu deixei, eu sabia que ela ficaria melhor depois. Então, por que não?

Em mim, ela viu algo que ela não queria ser e, assim, ela cresceu, amadureceu e sobreviveu. Hoje, ela já olha para mim com orgulho, pois gosta do que vê. Ela consegue ver tudo o que ela deixou para trás e o quanto esse deixar para trás a fez ganhar.

Eu nunca irei abandoná-la, sempre irei cumprir o propósito para o qual fui feito, mostrar para ela quem e como ela realmente é. Afinal, sou um espelho, e não um mero ser humano.

Um comentário:

  1. "Eu e ela" é o tipo da crônica originada de uma mente publicitária; mas não pense que isso a faz fácil, pois isso é tudo que essa crônica NÃO é. Tranformar elementos inanimados em personagens é um exercício de transposição dificílimo, mas que ela resolve com maestria.

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